Atabaques,
mulheres de turbante e homens vestidos a caráter para rituais
sagrados. Este foi o cenário, ontem, na Câmara Municipal de Salvador.
Cerca de 500 pessoas ligadas ao candomblé e outras religiões afros
protestaram contra o projeto de lei do vereador Marcell Moraes, que
proíbe o sacrifício de animais em rituais.
Não podemos retroceder! Antes das
pessoas falarem de ecologia, o candomblé sempre preservou o meio
ambiente e a vida. Dizer que matamos animais é um atestado de profundo
desconhecimento da nossa religião. É intolerância, estamos voltando no
tempo. Daqui a pouco, vamos ter que pedir autorização para realizar
nossos cultos, bradava emocionada Jacilene Nascimento, equede do Ilê
Axé Ibá Lugan.
Antes mesmo do início do ato político,
os dois grupos (povo de axé e ambientalistas) entraram em confronto.
Comer carne animal faz parte da nossa base alimentar desde que o mundo é
mundo. O que eles querem é acabar com nossa religião, sem ao menos
conhecê-la, afirmou tatá Ricardo, de Camaçari. Já a estudante de
direito Jaqueline Gonçalves é a favor do projeto: Muitos comportamentos
foram mudados ao longo da história, por que não é possível fazer
diferente?.
Para mãe Jacira de Yansã, o que moveu o
projeto foi o total desconhecimento das práticas das religiões de matriz
africana. Temos total cuidado com os bichos que serão sacrificados.
Eles passam por uma preparação para que o ato seja indolor. Folhas
sagradas são usadas e o corte é um só, feito por um sacerdote.
Proposta pode ser arquivada
O professor da Ufba e da Uneb, o
advogado Samuel Vida, explica que o projeto que tenta acabar com o
sacrifício de animais para práticas religiosas é ilegal e fere a
Constituição. Vivemos em um País laico e a Constituição, nosso maior
referencial para o direito, no seu Artigo 5º,
garante a liberdade de
culto.
O vereador deveria saber que em todas as cidades onde este tipo de projeto foi apresentado, acabou vetado.
Segundo o secretário estadual de
Promoção da Igualdade Racial, Elias Sampaio, o projeto é absurdo e
agrega outros problemas, como intolerância e desconhecimento. Para o
vereador Sílvio Humberto, se a Comissão de Justiça seguir o parecer e
for como foi em outras cidades, o projeto não vai para frente.
Ameaça de ocupação
Com o debate quente sobre a proposta do
vereador, os líderes religiosos atestaram que se o Projeto de Lei não
for retirado haverá uma ocupação da Câmara Municipal de Salvador. Agora
cabe a ele. Se não tinha conhecimento, deveria procurar se informar
melhor.
Somos organizados e unidos, não vamos
sair daqui, afirmou Jacilene Nascimento. Líderes de outras religiões
também se posicionam. Uma das representantes da Igreja Universal, a
vereadora Eronildes Vasconcelos, a Tia Eron, afirmou que discorda do
projeto de Marcell Moraes por ferir a Constituição, que garante a
liberdade de culto. Mesmo tendo outra opção religiosa, não posso
concordar com o desrespeito. Essa casa é do povo e deve representar a
todos, afirmou.
Assessora do vereador Marcell Moraes, a
veterinária Lilia Amorim afirmou que houve um equívoco na elaboração do
projeto e que ele não tem a proposta de atacar o candomblé. O vereador
vai se retratar. Foi um erro a forma como o projeto foi apresentado,
reconheceu.
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